segunda-feira, 17 de abril de 2017

Só pra lembrar! Porque o Ministério da Cultura foi destruído, imediatamente, no pós-golpe?

Só para lembrar. Porque o temer/golpe extinguiu a ‘toque de caixa’ o Ministério da Cultura? O movimento foi tão súbito que pegou todo mundo, ainda, sob os efeitos do golpe e não se percebeu o que de fato significou aquilo... A extinção do ministério.

Claro que o velho discurso/desculpa de ‘contenção de despesa’ com sua fusão ao Ministério da Educação pode ter agradado ou tenha sido suficiente para alguém mais apressado.

Entretanto um detalhe histórico, o pós 64 – é isso, o golpe militar de 64 – dissolveu com 3 dias algo equivalente,  foi o ISEB – Instituto Superior de Estudos Brasileiros. Criado por Café Filho, em 1955. O ISEB foi um centro agregador das ideias desenvolvimentistas no país, que percebia a cultura enquanto elemento impulsionador de transformações sociais e construtora da identidade nacional.
Parece mera coincidência, não?

Identidade nacional não é algo que surge, assim, como em um passe de mágica e muito menos por ‘geração espontânea’.

É um processo meticuloso que forma um substrato, um fundamento essencial para a formação da noção de povo, de país, da identidade nacional, de soberania e de desenvolvimento econômico autônomo. Daí a urgência em sua eliminação.

Logo, é um setor altamente estratégico e incompatível com coisas tipo ‘golpes’.

A extinção do Ministério da Cultura e o combate da força contra a inteligência

“Não foi por acaso que uma parcela muito expressiva dos artistas brasileiros se posicionou contra o golpe, com maior ou menor ênfase. Jovens artistas se juntaram a nomes já consagrados em um coro polifônico que rejeita a interrupção do processo democrático. Temer tem consciência desse processo. Sua resposta foi a extinção do MinC”

Todo golpe de Estado trava uma luta particular contra a inteligência e farsantes repetem a história mesmo sem saber. Três dias após se impor, em 1964, a ditadura civil-militar extinguiu o ISEB – Instituto Superior de Estudos Brasileiros.

Criado por Café Filho, em 1955, o ISEB foi um centro agregador das ideias desenvolvimentistas no país, que percebia a cultura enquanto elemento impulsionador de transformações sociais e construtora da identidade nacional. Temer, um pouco mais ágil, extinguiu o Ministério da Cultura no mesmo dia de sua ilegítima posse. O MinC é o ISEB de Temer.

O golpe da dupla Temer/Cunha não seria possível sem o combate à inteligência, comum a todos os atos que atentam contra a ordem democrática no mundo moderno. Sem manipular a informação, a farsa midiática-jurídica que leva Temer ao comando do país não teria sido possível. Sem derrotar – pela força ou cooptação – a inteligência crítica desse país, não será possível levar adiante seu governo ilegítimo.

O presidente-interino sabe que enfrentará um cenário adverso. A crise econômica ainda não atingiu seu ápice e a situação fiscal do Estado é gravíssima. O apoio dos grandes grupos de mídia pode não ser suficiente para alavancar e sustentar sua já precária popularidade.

A comunidade cultural se mobilizou em peso contra o golpe, surpreendendo até mesmo setores da esquerda e do campo progressista. A extinção do MinC foi a resposta de Temer à ampla desaprovação, pela comunidade cultural, de sua conspiração.

É preciso considerar o papel do Ministério da Cultura e das políticas culturais nos últimos anos para se compreender o ataque golpista ao principal órgão da gestão cultural no país e a comparação com o ISEB é, de fato, oportuna.

A instituição extinta pelos militares promovia reflexões valiosíssimas a respeito do desenvolvimento do país. Em torno dela se articulavam alguns dos mais importantes intelectuais brasileiros, tais como, Nelson Werneck Sodré, Hélio Jaguaribe, Candido Mendes, Joel Rufino dos Santos, dentre outros. Gilberto Freyre, Celso Furtado e Heitor Villa-Lobos foram alguns de seus colaboradores.

O ISEB foi uma instituição que buscou pensar o Brasil moderno, o desenvolvimento nacional sob outras bases e a formação do povo brasileiro. Houve uma profunda colaboração entre o ISEB e o Centro Popular de Cultura – CPC – da UNE, também extinto pela ditadura civil-militar.

Nos últimos anos, com o empobrecimento do debate nos espaços tradicionais dos círculos progressistas e dos movimentos sociais no Brasil, a cultura passou a ocupar um lugar ainda mais destacado no campo da reflexão crítica sobre o país.
E a capacidade de mobilização social da cultura, na última década, tem sido algo singular. Uma diversidade caótica reúne as mais diferentes formas de ativismo em torno de agendas que, raramente, se encerram no círculo, ainda precário, das políticas culturais.

Os movimentos culturais, que tiveram papel importante nas mobilizações de junho de 2013, debatem as cidades, o meio ambiente, a soberania alimentar, a mobilidade urbana, educação, saúde, habitação, internet, direitos humanos, dentre inúmeros outros temas. Há consciência organizada, transformadora.

Essa energia foi impulsionada, em especial, a partir do ano de 2003, quando a gestão de Gilberto Gil e Juca Ferreira deu início a um conjunto de políticas públicas inovadoras no âmbito da cultura, dentre as quais se destaca a criação dos pontos de cultura.

No contexto do processo de inclusão social massivo, iniciado pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva, os pontos de cultura contribuíram para a profunda mudança verificada no tecido social brasileiro na última década. Eles deram voz à diversidade cultural das periferias brasileiras, ao mesmo tempo, em que tocaram, sensivelmente, um Brasil esquecido, profundo, que sobrevive nas manifestações culturais tradicionais, historicamente marginalizadas e ignoradas pelas políticas públicas desenvolvidas pelo Estado brasileiro.

Mas, o espectro das políticas culturais desenvolvidas na última década é bem mais amplo, indo muito além dos pontos de cultura. Envolve o apoio a projetos de economia criativa; a articulação com o sistema educacional através do “Mais Cultura” nas escolas e Universidades; a retomada da produção audiovisual no Brasil – que se revigorou e mobiliza importantes segmentos econômicos numa atividade que retorna ao Estado mais do que é investido em seu fomento.

O MinC atuou, ainda, para consolidar o Sistema Nacional de Cultura, mobilizando estados e municípios em todo o país e criando uma ampla rede de participação social na gestão cultural, em todos os níveis. Tive o privilégio de vivenciar de perto esse processo, no último período, quando estive à frente da Secretaria de Articulação Institucional do MinC, na segunda passagem de Juca Ferreira pelo Ministério. Juca, por sinal, vinha retomando ou aperfeiçoando esse amplo conjunto de iniciativas.

Outra agenda protagonizada pelo MinC – e que tem levado o Brasil a uma posição de vanguarda – diz respeito à regulação do direito autoral, em especial, no ambiente da internet. Artistas, de distintas posições político-ideológicas apoiaram os esforços do Ministério nos últimos anos visando a garantia de um tipo de regulação que afirme a soberania do país no contexto da economia globalizada.

Poderíamos mencionar, ainda, o próprio debate sobre a regulação da internet no Brasil e a mobilização de um novo tipo de ativismo político, que tornou possível a aprovação do Marco Civil da Internet – projeto, sistematicamente, combatido por Cunha e seus aliados, vassalos das grandes corporações na área das telecomunicações.

Tudo isso contribuiu para consolidar um movimento social das culturas vigoroso, persistente que se renova, cresce e se reinventa, apesar das inúmeras dificuldades enfrentadas por essa gente insistente, que realiza a incrível e esplendorosa diversidade cultural do povo brasileiro. A cultura permanece como espaço de mobilização e reflexão crítica sobre o país.

Não foi por acaso que uma parcela muito expressiva dos artistas brasileiros se posicionou contra o golpe, com maior ou menor ênfase. Jovens artistas se juntaram a nomes já consagrados em um coro polifônico que rejeita a interrupção do processo democrático. Temer tem consciência desse processo. Sua resposta foi a extinção do MinC.

O ilegítimo governo Temer-Cunha é fruto de uma fraude, baseada na manipulação da informação e no toma-lá-dá-cá de um parlamento corrompido pelo financiamento empresarial de campanhas. O combate à inteligência é consequência inevitável de uma ação de força conduzida por representantes do que há de mais atrasado e conservador no país.

A extinção do Ministério da Cultura, e sobretudo a desmobilização da comunidade cultural, reforçando a medíocre retórica dos monopólios da informação, que tentam de todas as formas legitimar o ilegítimo governo de Temer, é parte do roteiro do golpe.

A forte reação da comunidade cultural à extinção do MinC, no entanto, demonstra que, a exemplo de seus predecessores, os golpistas de hoje não conseguirão vencer a inteligência crítica e a cultura de um país que saberá insistir no sonho de um futuro livre de tanto obscurantismo.

Por Vinicius Wu – Revista Forum

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