É notória tanto a ‘entrada’ via concurso público
bichado, seletivo, diga-se de passagem, como os critérios internos de ascensão
via promoções por ‘mérito’.
Conheço um caso – claro que não dá para citar nomes
ou maiores referências, retirei até o nome do Estado que tinha digitado inicialmente,
sobretudo porque não tenho como provar, ali ó, no papel, como se diz – de um
presidente de tribunal cujo filho fez um concurso para agente judiciário com as
respostas de todas as questões no bolso.
Claro que ele passou. O detalhe é que, sem querer
parecer preconceituoso, o dito cujo, o filho, era de uma ‘simploriedade’ que chegava
as raias de imbecilidade. Digo isso porque convivi com o dito cujo, casado com
a irmã de um amigo, e, até quando fiquei sabendo ele já tinha ascendido internamente,
onde o seu pai era o presidente, como falei no princípio.
Agora, isso que vou relatar tem toda cara de
lorota, como se diz, mas, o fato é que na sequência, algum tempo depois, eu e o
meu amigo – cunhado do agraciado com o gabarito da prova e filho do presidente –
tínhamos nos inscrito para um concurso ao mesmo cargo, agente judiciário, quando
em meio ao nosso trato com as apostilas onde estudávamos juntos em sua casa, ele
me apareceu todo sorridente, com o tal gabarito, praticamente às vésperas das
provas, dizendo que o cunhado tinha conseguido para nós...
Acredite se quiser ou considere como achar mais conveniente.
Eu dei um ‘piti’ ético-cívico em alto e bom som, que, como estava na casa do
amigo, atingiu parte de sua família que estava nas imediações. Só sei que passado
o susto diante de minha insanidade, praticamente romperem comigo na sequência,
já que, depois do meu vexame cívico, ele não teve coragem de usar sozinho o tal
gabarito e ambos perdemos no concurso.
Duro de acreditar, não? Pois é, mas foi o que aconteceu
e como saldo fiquei sem o amigo e a família amiga.
Conto esta historia para ilustrar um pouco o que deve
rolar com essas verdadeiras dinastias que reinam no Judiciário por todo o país.
O tal da ‘simploriedade’ deve, hoje, ocupar o cargo
– presidência – que foi do pai.
Fala-se tanto em reformas no país, mas ‘um lugar’
onde algo vai ter que ser feito é no Judiciário, para que nossos sonhos e/ou veleidades de construirmos um país efetivamente democrático e justo possam ser, de fato,
concretizados.
"Elites controlam o sistema judicial, mostra pesquisa da USP
Tese conclui que elites
jurídicas provêm das mesmas famílias, universidades e classe social.
São Paulo – Há, no sistema jurídico nacional, uma
política entre grupos de juristas influentes para formar alianças e disputar
espaço, cargos ou poder dentro da administração do sistema. Esta é a conclusão
de um estudo do cientista político Frederico Normanha Ribeiro de Almeida sobre
o judiciário brasileiro. O trabalho é considerado inovador porque constata um
jogo político “difícil de entender em uma área em que as pessoas não são
eleitas e, sim, sobem na carreira, a princípio, por mérito”.
Para sua tese de doutorado A nobreza
togada: as elites jurídicas e a política da Justiça no Brasil, orientada
pela professora Maria Tereza Aina Sadek, da Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas (FFLCH) da USP, Almeida fez entrevistas, analisou currículos e
biografias e fez uma análise documental da Reforma do Judiciário, avaliando as
elites institucionais, profissionais e intelectuais.
Segundo ele, as elites institucionais são compostas
por juristas que ocupam cargos chave das instituições da administração da Justiça
estatal, como o Supremo Tribunal Federal (STF), Superior Tribunal de Justiça,
tribunais estaduais, Ministério Público, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e
Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Já as elites profissionais são caracterizadas por
lideranças corporativas dos grupos de profissionais do Direito que atuam na
administração da Justiça estatal, como a Associação dos Magistrados
Brasileiros, OAB e a Confederação Nacional do Ministério Público.
O último grupo, das elites intelectuais, é formado
por especialistas em temas relacionados à administração da Justiça estatal.
Este grupo, apesar de não possuir uma posição formal de poder, tem influência
nas discussões sobre o setor e em reformas políticas, como no caso dos
especialistas em direito público e em direito processual.
No estudo, verificou-se que as três elites
políticas identificadas têm em comum a origem social, as universidades e as
trajetórias profissionais. Segundo Almeida, “todos os juristas que formam esses
três grupos provêm da elite ou da classe média em ascensão e de faculdades de
Direito tradicionais, como o Faculdade de Direito (FD) da USP, a Universidade
Federal de Pernambuco e, em segundo plano, as Pontifícias Universidades
Católicas (PUC’s) e as Universidades Federais e Estaduais da década de 60”.
Em relação às trajetórias profissionais dos
juristas que pertencem a essa elite, Almeida aponta que a maioria já exerceu a
advocacia, o que revela que a passagem por essa etapa "tende a ser mais
relevante do que a magistratura”. Exemplo disso é a maior parte dos ministros
do Supremo Tribunal Federal (STF), indicados pelo Presidente da República, ser
ou ter exercido advocacia em algum momento de sua carreira.
O cientista político também aponta que apesar de a
carreira de um jurista ser definida com base no mérito, ou seja, via concursos,
há um série de elementos que influenciam os resultados desta forma de
avaliação. Segundo ele, critérios como porte e oratória favorecem indivíduos
provenientes da classe média e da elite socioeconômica, enquanto a militância
estudantil e a presença em nichos de poder são fatores diretamente ligados às
relações construídas nas faculdades.
“No caso dos Tribunais Superiores, não há
concursos. É exigido como requisito de seleção ‘notório saber jurídico’, o que,
em outras palavras, significa ter cursado as mesmas faculdades tradicionais que
as atuais elites políticas do Judiciário cursaram”, afirma o pesquisador.
Por fim, outro fator relevante constatado no
levantamento é o que Almeida chama de “dinastias jurídicas”. Isto é, famílias
presentes por várias gerações no cenário jurídico. “Notamos que o peso do
sobrenome de famílias de juristas é outro fator que conta na escolha de um
cargo-chave do STJ, por exemplo. Fatores como estes demonstram a existência de
uma disputa política pelo controle da administração do sistema Judiciário
brasileiro”, conclui Almeida.
Por Cida
de Oliveira
Com informações da Agência USP
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