O novo livro
do Humberto Eco chega em um momento
muito oportuno, quando a cada dia fica mais evidente a falácia que é – se
tornou? – a grande mídia, não só local, que não passa de um “pau mandado” à
serviço de interesses mais do que ideológicos, mas, sobretudo de quem “paga
mais”.
É um grande
ator do mal nas sociedades democráticas,
que ainda sobrevive graças à ignorância das pessoas que veem pseudo reportagens
e denúncias, mas, sobretudo manchetes sensacionalistas, já que muito pouco
se lê além das manchetes escandalosas nas capas, que enfeitam as bancas e
gôndolas de supermercados e lojas de conveniência.
Mas,
mesmo seus dias de gloria parecem estar no ocaso, pelo menos no Brasil, haja vista a grande onda de
demissões que assola estes veículos de desinformação e intrigas.
"Número
Zero", novo romance do escritor italiano, é ambientado em 1992 e mostra a
história de um jornal criado para difamar
Por
Kelly Velazquez
O
famoso escritor e ensaísta italiano Umberto Eco apresentou nesta semana na
Itália seu novo romance, Número zero, uma espécie de manual do mau jornalismo
ambientado na redação de um jornal imaginário.
O novo
livro do influente intelectual italiano, autor do famoso romance O nome da rosa
e de importantes tratados de semiótica, é uma história de ficção ambientada em 1992,
um ano particular para a Itália contemporânea, marcado pelos escândalos de
corrupção e pela investigação "Mani Pulite" (Mãos limpas), que
arrasou com boa parte da classe política da época.
O
livro se concentra, sobretudo, nos mistérios não resolvidos que sacudiram
nestes anos a Itália, entre eles o protagonizado pela loja maçônica Propaganda
2 do temido Licio Gelli, que queria dar um "golpe branco". "É o
primeiro romance de Eco que fala de uma época tão recente", reconhece
Elisabetta Sgarbi, diretora da editora Bompiani.
Eco
descreve a redação imaginária de um jornal, criado naquele ano, para
desinformar, difamar adversários, chantagear, manipular, elaborar dossiês e
documentação secreta. "Para mim é um manual da comunicação de nossos
dias", sustenta Roberto Saviano, renomado jornalista antimáfia da Itália,
que vive sob escolta pelas ameaças de morte que recebe das organizações
criminosas.
Em uma
conversa entre Eco e Saviano, publicada pela revista L'Espresso, o semiólogo
afirma que não quis escrever um "tratado de jornalismo", mas contar
uma história sobre os limites da informação, sobre como funciona uma máquina de
denegrir, e não tanto sobre o trabalho de informar. "Escolhi o pior caso.
Quis dar uma imagem grotesca do mundo, ainda que o mecanismo da máquina para
sujar, de lançar insinuações, já fosse usado durante a Inquisição",
comentou Eco.
Saviano,
que considera que as redes sociais multiplicaram esta forma de denegrir gerando
verdadeiros monstros, acredita que o magnata das comunicações e ex-primeiro-ministro
Silvio Berlusconi marcou o início dessa era, entre boatos e informações, vida e
vícios tanto privados quanto públicos. "Escolhi 1992 porque considero que
este ano marca o momento de um declínio na história da sociedade
italiana", disse Eco em uma entrevista ao Corriere della Sera.
No
livro, o semiólogo se diverte citando frases famosas ou lugares comuns do
jornalismo, como "no olho do furacão", "um duro revés" ou
"com a água no pescoço". "Não é necessário estrangular a avó
para perder a credibilidade. É suficiente contar que o juiz usa meias na cor
laranja. Por que será?", contou Eco citando um caso verdadeiro durante uma
longa entrevista à RAI.
Graças
aos delírios de um redator paranoico, Eco conta fatos concretos, mas
reconstruídos a partir de teorias bizarras ou que se entrelaçam estranhamente
com outras e que terminam por criar uma nova notícia.
É o
caso da loja maçônica P2, do suposto assassinato do papa Luciani (João Paulo
I), dos cúmplices das brigadas vermelhas que trabalhavam para os serviços
secretos, dos tentáculos da CIA, dos atentados e até de um falso cadáver de
Benito Mussolini com o qual conseguiram salvá-lo e enviá-lo à Argentina. Todas
são histórias que o leitor não conseguirá determinar se são fatos inventados ou
a descrição da realidade, segundo o escritor.
Trata-se
do sétimo romance de Eco, que publicou, entre outros, O Cemitério de Praga e O
Pêndulo de Foucault.
Leia
mais na AFP
Da Carta Capital e publicado em JornalGGN
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