A demonização do financiamento gerador de produção
e emprego no Brasil é a maior afirmação do “complexo de vira-lata”.
Todos sabemos que o mais importante ingrediente da
campanha eleitoral foi a insistência da oposição na necessidade de um “ajuste fiscal”, o que o Governo negou peremptoriamente. Pois bem. Antes
mesmo da nova investidura, a presidenta reconheceu implicitamente a realidade.
Enviou ao Congresso algumas medidas que haviam sido preparadas pelo ilustre e
mal compreendido ministro Guido Mantega. Tranquila e dialeticamente, negando a
negação, o governo, como São Paulo na estrada de Damasco, sofreu uma conversão
de 180 graus na sua política econômica.
Os eleitores, tanto os que preferiram Dilma (um
pouco mais de um terço) como os que a rejeitaram (um pouco menos de dois
terços), receberam, uns com enorme desilusão, outros com enorme ceticismo, o
incontornável “ajuste fiscal”. E o PT, o principal beneficiário do “desajuste fiscal”, o recebeu com ambos os
sentimentos. A essa gigantesca confusão política somou-se a econômica, o que
inibiu uma coordenação sólida e confiável entre o Executivo e a sua base
“virtual”, agora em reconstrução, devido à competência e habilidade do
vice-presidente Michel Temer.
Isso deu margem para que, ao lado do aumento do
desejável protagonismo do Legislativo, importante fator de aperfeiçoamento do
processo democrático, se propagassem no Congresso mitos insensatos, como é o
caso, por exemplo, de sugerir que os empréstimos para exportação de serviços de
engenharia do BNDES são um “prejuízo nacional” e expô-lo a uma Comissão
Parlamentar de Inquérito.
Mesmo
competente e com a melhor intenção, ela pode prejudicar a exportação de tais
serviços que vimos construindo com paciência e algum sucesso desde 1966.
Nossos
competidores no mercado internacional de serviços de engenharia são Espanha,
EUA, China, Alemanha, França, Itália e Coreia, sempre atentos a qualquer
informação que lhes dê alguma vantagem, inclusive usando os seus serviços
oficiais de espionagem. É abusivo dizer que o BNDES é uma “caixa-preta” e é
erro grave afirmar que deve dar publicidade às minúcias das suas operações.
Isso revelaria detalhes dos contratos de seus clientes que seriam preciosas
informações para nossos concorrentes e, portanto, contra o Brasil. É preciso
perguntar: por que o Ex-Im Bank dos Estados Unidos não aguenta a concorrência
dos insondáveis subsídios do Ex-Im Bank chinês, a despeito da regulação da OMC?
É claro que o BNDES deve “prestar contas” aos
órgãos reguladores, mas sob a proteção do sigilo. É preciso entender que os
recursos do chamado BNDES-Ex-Im não são remetidos para o país onde se faz o
investimento. São usados como pagamentos em reais no Brasil, para centenas de
empresas médias e pequenas, com milhares de operários, que fornecem produtos
“exportáveis”, sem serem diretamente exportadoras. Elas jamais o seriam se não
houvesse uma “epecista” (empresa de projeto e construção) que as estimula e,
não raramente, as ajuda a promover a incorporação de desenvolvimentos
tecnológicos exigidos na dura competição internacional. O Brasil tenta há muito
tempo qualificar-se como um exportador de serviços de engenharia. De acordo com
informações internacionais confiáveis (Engineering News Record) ainda
ocupamos uma participação muito modesta no setor, sete vezes menor que a de
Espanha, EUA e China, e quatro vezes menor que a de Alemanha, França e Coreia.
Somados, esses competem, com subsídios, por dois terços de um mercado da ordem
de 550 bilhões de dólares por ano.
O desenvolvimento econômico depende de dois
vetores: do investimento e da exportação. Os dois produzem efeitos
multiplicadores parecidos, mas, sem a sólida expansão das exportações, o
desenvolvimento pode ser abortado pelos déficits em conta corrente. A
exportação de serviços de engenharia estimula o investimento nacional e a
incorporação da melhor tecnologia para vencer a dura competição.
Lamentavelmente, o saldo dessa conta tem diminuído. Depois de passar por um
máximo de 4,3 bilhões de dólares em 2012, hoje anda por volta de 2 bilhões, com
viés de baixa...
Não há maior afirmação do famoso “complexo de
vira-lata” do que demonizar o suporte do BNDES quando financia despesas em
reais que geram produção e emprego no Brasil e não a instalação externa. E não
há maior miopia do que não enxergar que “exportar é o que importa”.
Por Delfim Netto
Agência
Brasil (CartaCapital)
Se gostou deste post subscreva
o nosso RSS Feed ou siga-nos no Twitter
para acompanhar nossas atualizações
*
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Olá!
Bem vindo, a sua opinião é muito importante.