domingo, 21 de outubro de 2018

Um pouco de História ou o Brasil de 50 anos atrás que o Bolsonaro planeja “refundar”


Este artigo é bem oportuno, pois nos remete há um pouco de nossa História de tão triste memória, que o Bolsonaro  insiste em afirmar que vai reproduzir, ou melhor retroagir há 50 anos atrás e criar, entre aspas, o Brasil que quer, que deseja em sua insanidade, que além disso e bem lúcida quando também pensa em colocar o país à serviço de interesses estrangeiros, sobretudo dos EUA.

Não, não é intriga, não é a famosa fake news – que ele tão bem usa e abusa no WhatsApp – ele disse em alto e bom som mais de um vez para quem quis ouvir, já que confia cegamente na cegueira política e até, mesmo irracionalidade, de seu eleitorado, que parece cativo em marchar com ele rumo ao desastre político e econômico, o que de resto sobraria para todos nós, é claro!

        "Bolsonaro quer o Brasil de 50 anos atrás. Isso seria um desastre
É fácil e claro saber o que o candidato Jair Bolsonaro é contra. O Brasil que o deputado quer, porém, é bem mais turvo. O seu plano de governo é simplista e Bolsonaro contradiz propostas de aliados constantemente – isso quando elas vão além dos clichês e palavras de ordem. A única chance de entender quais são nas raras entrevistas e em seus monólogos transmitidos no Facebook.
Ontem, Bolsonaro falou o seguinte a uma rádio AM de Barretos, interior de São Paulo: “nós queremos um Brasil semelhante àquele que tínhamos há 40, 50 anos atrás. Pode ter certeza que juntos chegaremos lá.”
Voltando o meio século proposto por Bolsonaro, caímos em 1967 – no começo da ditadura militar, um ano antes do AI-5. Não há novidades na defesa de posições retrógradas por Bolsonaro – e muito menos da ditadura. O candidato já deixou muito claro seu apreço pelo regime totalitário e por práticas como a tortura, por exemplo.
Mas a defesa explícita do Brasil de 1967 chama a atenção porque o Brasil de 50 anos atrás era pior. É difícil saber o que Bolsonaro quer resgatar daquele Brasil, e talvez nem o próprio saiba exatamente.
Brasil melhorou em diversos aspectos. É inegável que o nosso arremedo de social-democracia, consolidado a duras penas em 1988, trouxe avanços consideráveis em pontos como saúde e educação. Para ajudar a refrescar a memória – e deixar claro o quanto a democracia tornou o Brasil um lugar melhor para se viver – resolvemos relembrar como era o Brasil de 50 anos atrás.
1. O atendimento à saúde era ruim e restrito
Ainda não havia o Sistema Único de Saúde, o SUS. Foi só em 1988 que o Brasil deu a todos o direito de um atendimento gratuito de saúde – ainda que muitas vezes ele deixe a desejar.
Antes disso, a maioria da população não tinha acesso a qualquer tipo de serviço. A cobertura de saúde era garantida apenas à parcela da população empregada formalmente, que era contribuinte da Previdência.
Os principais índices de saúde melhoraram constantemente nos últimos 50 anos. A mortalidade infantil despencou de 124 para 14 mortes a cada mil nascimentos. Enquanto isso, a expectativa de vida aumentou de 46 para 76 anos.
O candidato pretende manter os gastos em saúde pública como estão, ainda que a população aumente. Ainda antes da campanha, o candidato falou: “não adianta um pré-candidato dizer por aí: ‘a, eu vou aumentar o recursos para o SUS. Não é por aí”.
2. Mais de um terço da população era analfabeta
Ninguém em sã consciência defenderia a qualidade da educação pública brasileira, especialmente da mais básica. Mas, em comparação com o seu passado, o Brasil deu um salto que teve consequências brutais na vida de dezenas de milhões de brasileiros.
Há cinquenta anos, mais de um terço da população brasileira com mais de quinze anos era analfabeta – 39,7% em 1960. Hoje, 7% da população com mais de quinze anos não sabe ler e escrever.
As propostas para a área tem se resumido a uma valorização do ensino a distância, inclusive para o fundamental (crianças a partir de 11 anos). Mas nesse ponto, o seu vice, General Mourão, já deixou claro que pretende retomar as aulas “patrióticas” da época da ditadura – aulas de educação moral e cívica e organização social e política brasileira.
3. O trabalhador rural não tinha previdência
O trabalhador rural era um cidadão de segunda classe. Não tinha planos de aposentadoria e, na prática, qualquer direito trabalhista. Sem registro e organização formal, a situação deles há 50 anos lembrava mais o século 19 do que o 20.
Com o Estatuto do Trabalhador Rural, em 1963, o país tentou levar os direitos trabalhistas ao trabalhador do campo. Mas fracassou, e o estatuto foi letra morta. Os trabalhadores rurais só tiveram direito à Previdência com a criação do Funrural, em 1971.
Uma das medidas mais bem sucedidas para a redução da pobreza que o país já teve, a previdência rural agora está em risco – a reforma de Temer, por exemplo, acabava com seu caráter redistributivo. Bolsonaro ainda não deixou claro se deve ou não manter essa política.
4. Empregadas domésticas não tinham direitos
Há meio século, empregadas domésticas e autônomos estavam excluídos da Previdência. Eles só foram incorporados no começo dos anos 1970. Foi o general Médici, o mais linha dura da ditadura, o responsável pela medida.
Na prática, as empregadas domésticas não eram formalizadas, e ficaram sem direitos até a promulgação da PEC das Domésticas, que finalmente obrigou a formalização delas. Bolsonaro já se orgulhou de ser o único a votar contra essa proposta.
5. Somente dois partidos eram permitidos
Acuado por derrotas eleitorais em diversos estados, os militares acabaram com todos os partidos do país há cinquenta e dois anos. No dia 27 de outubro de 1965, o sistema partidário que vigorava desde a década de 1940 foi substituído por um novo onde só cabiam dois: a Arena, partido dos militares, e o MDB, onde estava a oposição consentida.
Se hoje nosso problema é que temos mais de trinta partidos, pior seria como estávamos há cinquenta anos. O próprio Bolsonaro já passou por nove partidos, e tomou proveito dessa situação ao se filiar a um partido nanico somente para se candidatar à Presidência.

Pierro Locatelli em The Intercept.
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