segunda-feira, 30 de maio de 2016

Déficit de deliberação ou (também) porque o STF vem pisando na bola reiteradas vezes


Regras e práticas internas podem prejudicar a qualidade dos debates, e decisões, dos ministros do STF, conforme afirma o professor entrevistado, quando afirma que são, praticamente, inexistentes, inclusive quando estão em questão problemas mais sérios e vitais para o país. 

O discurso do professor entrevistado/consultado sobre a dinâmica do STF, embora seja objetivo na análise, passa ao largo da questão política, que é o que tem norteando as decisões mais sérias, e graves, do tribunal, decisões estas que vêm mudando os rumos do país e a vida da população.

O personalismo e o engajamento político explícito, como é o caso do Gilmar Mendes ao PSDB, aliado ao modelo predominante dentro da casa que privilegia isso, vem tornando figuras como estas prepotentes demais, o que talvez não condiga com a importância da função que exercem, já que, pelo visto, podem decidir sozinhos o resultado ou os rumos de questões de extrema seriedade e severidade, como o caso do julgamento do golpe recente. 

Não tem qualquer sentido ou lógica deixar, praticamente, nas mãos de um individuo – graças às metodologias internas do tribunal – a decisão sobre um caso tão sério como o que deve entrar em pauta proximamente, o julgamento do golpe, sendo que recentemente a estrela psdbista do tribunal foi vista (28/05/2016) entrando sorrateiramente, na calada da noite no palácio do governo interino, o Temer, para conversas sobre o que ou quais teores?

Um ato assim, a visita escondida ao golpista não o tornaria suspeito, logo impedido de participar da votação do dito delito, o golpe?
"Déficit de deliberação
Em uma democracia representativa, a legitimidade dos cargos eletivos estaria assegurada constitucionalmente pela confiança que a população deposita, por meio do voto, em seus representantes. No Poder Judiciário os integrantes de sua cúpula nunca são eleitos, embora, no caso do Supremo Tribunal Federal (STF), sejam nomeados pelo presidente da República e a indicação passe por aprovação do Senado. Da corte da qual saem as decisões mais importantes do sistema judicial espera-se que a legitimidade emane do saber de seus 11 ministros. “Uma das fontes de legitimidade é a qualidade das deliberações do tribunal”, diz Virgílio Afonso da Silva, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Com decisões bem fundamentadas e centralizadas em poucas mãos, o STF, em seu papel principal de guardião da Constituição, faria o escrutínio necessário das leis votadas no Congresso, numerosas e muitas vezes confusas ou contraditórias entre si.

O problema reside em saber se as deliberações do Supremo são, de fato, as melhores possíveis. Essa foi a motivação do estudo “A prática deliberativa do STF”, que Silva iniciou em 2011 e está em fase de finalização. As entrevistas  da pesquisa tinham  por objetivo compreender como os próprios ministros do STF encaram o processo deliberativo do qual participam, uma vez que, segundo o pesquisador, “cada ministro novo se vê compelido a seguir o rito ditado pela tradição e pelo regimento interno”. Silva entrevistou 17 integrantes e ex-integrantes do STF, assegurando que as informações seriam usadas de forma anônima, a fim de deixar “os ministros à vontade para expor suas opiniões” e, com isso, retratar o processo decisório do tribunal. O estudo conclui que regras e práticas internas do STF prejudicam a qualidade das deliberações.

Não se trata de defender um modelo único de processo decisório. “As sessões podem ser públicas ou reservadas, o tribunal pode permitir ou proibir votos divergentes, produzir decisões únicas ou que apresentem os votos de todos os integrantes, ter liberdade nas escolhas de casos ou não”, diz Silva. O professor Diego Werneck Arguelhes, da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-RJ), lembra que as deliberações da suprema corte alemã, por exemplo, são sempre secretas, regra que talvez sofresse rejeição se fosse adotada no Brasil. “No entanto, a opinião pública confia naquelas pessoas por defenderem ideias sedimentadas em décadas de atuação”, afirma. No tribunal constitucional alemão as decisões são pronunciadas apenas pelo presidente da corte e de modo quase sempre consensual. “O consenso é visto como sinal de que a decisão é a melhor tentativa de abordar a questão, feita por especialistas bem-intencionados.”

É nesse ponto que a diferença entre os processos decisórios no Legislativo e no Judiciário fica mais clara. Enquanto os parlamentares foram escolhidos para expressar interesses parciais, por terem sido eleitos para representar segmentos da população, os ministros do STF têm, segundo Silva, a obrigação de interpretar e aplicar a Constituição de acordo com a convicção de que a Carta deve ser a expressão da razão pública, conceito do filósofo do direito norte-americano John Rawls (1921-2002) que se refere ao consenso em torno de uma concepção de justiça compartilhada pelo conjunto da sociedade.

Uma deliberação de boa qualidade tomada em conjunto pressupõe enunciar e ouvir argumentos para que o grupo chegue a uma decisão comum, e não apenas à da maioria de seus integrantes. No caso do STF, vários fatores têm prejudicado a qualidade das deliberações. Os problemas começam no relator, tema analisado por Silva em artigo publicado no ano passado na Revista Estudos Institucionais, periódico vinculado à Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Na opinião da maioria dos ministros entrevistados pelo autor, o relator tem um papel decisivo no processo no STF, pois ele “baliza todo o debate”.

Continue, aqui. em Revista de Pesquisa da Fapesp

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