Um detalhe interessante
em tudo isso é que desta “elite” que se julga o supra sumo da
civilidade, senão da honestidade, fazia parte a dona da Daslu
– já falecida – mãe da moça da foto, que foi presa pela
Polícia Federal por ter feito aquele templo de consumo de alto luxo
com mercadorias contrabandeadas, em nada comprometeu a imagem do
empreendimento nem dos proprietários diante da clientela “refinada’
que fica “metendo o pau” na desonestidade dos outros, como pode
ler abaixo.
Marcela Tranchesi, filha da dona da Daslu |
Clientela da Daslu comenta o “mensalão”
Na tarde de terça-feira, dia 7, um grupo de empresárias, socialites e “descoladas” de São Paulo assistia ao desfile de lançamento da nova coleção de verão da Daslu, no shopping Cidade Jardim.
Naquele momento, o STF (Supremo Tribunal Federal) realizava a segunda sessão para ouvir os advogados dos réus do “mensalão”.
Em 2005, no auge do escândalo, o maior da era Lula, a dona da butique, Eliana Tranchesi, foi presa por suspeita de sonegação.
A investigação que atingiu a empresária, ícone do luxo, foi interpretada por sua clientela como retaliação, uma forma de o governo desviar a atenção. Eliana morreu em fevereiro, sem que seu julgamento, ao contrário do “mensalão”, chegasse ao fim.
A Daslu foi vendida, mas conserva parte da freguesia. Que torce, de forma quase unânime, pela prisão dos principais réus.
“Chego em casa à noite e leio quem falou que mentira. Fico nervosa e não consigo dormir”, diz Marcela Tranchesi, 21, filha da empresária. “O ideal é que todos sejam condenados. Não digo os 38 [réus], não sei se todos são culpados. Mas muitos.”
“Eu tenho nojo! Fico com a Carminha [da novela Avenida Brasil, da Globo], não com o Zé Dirceu!”, diz a socialite Anna Maria Corsi, 71.
Carolina Pires de Campos incentiva a amiga a continuar: “E o que é o ‘mensalão’, Anna?”. “Sabe o que é isso? É nordestino querer fazer alguma coisa em São Paulo”, responde Anna. “E é erradíssimo. Eles têm de ficar lá, em Garanhuns [cidade de Lula], lá no fuuundo do Pernambuco, lá no fuuundo do Ceará. Aqui, não, aqui é de paulista e de paulistano. É por isso que isso está acontecendo”.
A coluna lembra que há vários paulistas no “mensalão”. “Ah, claro…”, diz ela, para arrematar: “Eu não gosto do [José] Serra. Aqui, nós precisamos é de pessoas como o Fernando Henrique!”.
Carolina Pires interrompe Anna. “Deixa eu falar uma coisa. Meus filhos eram petistas, assim, fanáticos. Eu tenho um filho juiz, outro advogado, que não é mais petista. Aliás, a pessoa que eu mais adoro é a [Luiza] Erundina [PSB/SP]. Eu já gostava [antes de ela desistir de ser candidata a vice-prefeita de Fernando Haddad por causa da aliança do PT com Paulo Maluf]. Agora, mais ainda. Sou apaixonada por ela.”
Mas, apesar da torcida contra os “mensaleiros” e da intensa cobertura que a imprensa tem dado ao julgamento, a maioria não perde muito tempo com o assunto.
Marcela Tranchesi, por exemplo, comentava com as amigas que começou a correr pelas manhãs no parque do Povo, no Itaim. “Quero ter corpo para usar um vestido de tricô que vi no desfile.”
A estilista Mirelle Moreno, 24, que desenha roupas masculinas para a Daslu, comentava como é difícil fazer uma coleção com equipe enxuta. “É capaz que peguem esses 40 e poucos ladrões, mas o Ali Baba, que é o Lula, não vai cair”, disse à coluna, voltando logo aos comentários sobre sua coleção.
A radialista Stephanie Choate, 26, repórter do programa de Otávio Mesquita, telefonava para a mãe, que também estava na loja, mas em outro ambiente. “Vou entrar no provador de jeans, não está essa bagunça, tá vazio.”
Provocada pela coluna, diz que está atenta. “Estou totalmente disposta a ir para a rua, lutar por isso [a condenação]. É um arrependimento não ter nascido a tempo de ser uma cara-pintada [jovens que protestavam contra o governo Fernando Collor].” Duas estudantes de moda concordam: “Mas para pintar a cara, passaríamos antes na Sephora [loja de cosméticos francesa], né, amiga?”.
A produtora Gabriela Bucciarelli, 21, iria junto. “Não sou de algazarra, mas se ninguém for condenado, é o caso de ir até Brasília.”
A stylist polonesa Ela Pruszynska, 45, é casada com um brasileiro e mora em São Paulo há dois anos. Diz que não tem a menor ideia do que é o “mensalão”. “É uma coisa grave?”
“Não vejo cobrança no meu meio. As pessoas não se importam muito com o assunto”, diz Irene Martins, superintendente comercial, tomando champanhe numa pequena garrafa enquanto aguardava o desfile. “São todos [os políticos] farinha do mesmo saco.” “A gente torce [pela condenação], mas vai dar pizza”, dizia a arquiteta Gilda Arantes, com uma água perfumada para roupas de R$59,00 na sacola.
Guiando um carrinho de supermercado cheio de peças, a designer de joias Renata Camargo, 54, dizia que emagreceu e que por isso merece “um guarda-roupa novo”. Ela era uma das poucas que, naquela tarde, destoava da torcida. “A Dilma não sabia de nada [do “mensalão”]. E o Lula sabia pouco. Para mim, ele foi uma revelação. Antes dele, eu era contra o PT. Agora eu sou PT. É uma novela velha, mas temos de acompanhar.”
O marido de uma tradicional cliente da Daslu, empresário que tem concessão do governo e se aproximou do PT na era Lula, relatou à coluna que quase “apanhou” no casamento de um amigo, na igreja Nossa Senhora do Brasil, nos Jardins. “Quase quebrei o pescoço, de tanta tensão”, disse, pedindo que seu nome não fosse revelado.
Na festa, ele foi cobrado por ser amigo de alguns dos réus, que eram chamados de “ladrões, bandidos”. “Eu tentava argumentar, mas não deixavam. Principalmente as mulheres.” Elevou a voz e, segundo relata, afirmou: “Vocês querem fazer um bullying na era Lula”.
Diz que não negou a existência do “mensalão”, mas argumentou que não ocorreu apenas no governo do PT. “Eu disse: ‘Gente, nós estamos numa sala de aula. A classe toda tá colando. E agora estamos querendo pegar um aluno, aquele barbudo, com a voz rouca, que não tem um dedo, e expulsá-lo da sala. Isso é bullying puro, bullying da elite branca, que aliás também ‘cola’ na prova.”
Alguém lembra que uma consultoria [Tax Justice Network] calcula que em 40 anos os brasileiros depositaram cerca de R$1 trilhão em paraísos fiscais.
Nada funciona. Ele diz que apelou então para o pragmatismo. “Eu disse: ‘Gente, temos de pensar: nós ganhamos muito dinheiro na era Lula. E ele pode voltar. O que vai achar de tudo isso?’.” Os homens, ao menos, cederam.
No dia seguinte, do outro lado da marginal Pinheiros, em outro shopping, o JK Iguatemi, a Lool lançava a sua coleção de acessórios de verão. Amigas e clientes de Luiza Setubal, filha de Olavo Setubal Jr., se dirigiam para a loja. Alessandra Gabor, 29, redatora do blog da Lool, disse à coluna que estava achando o julgamento “banal, mas dentro do esperado”. “O [apresentador] Marcelo Tas colocou hoje no ‘Face’: no Brasil a realidade supera a ficção.”
Carmem Luzia, 55, passeava no shopping com sacolas da Le Lis Blanc e da Calvin Klein. “O ‘mensalão’ podia acontecer com qualquer partido”, opinou a dona de casa. E se disse confiante. “Ministra Cármen Lúcia [do STF]? Não conheço. Mas eu gosto daquele [ministro] Gilmar. Mendes, né? Ele tem pulso firme, não vai deixar o povo sair de fininho.” (do Limpinho e Cheiroso)
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