quinta-feira, 4 de junho de 2015

Cunha engole mais uma: 'PEC das doações privadas não tem valor legal', diz Marco Aurélio de Mello, do STF

Em entrevista ao Espaço Público, ministro do STF Marco Aurélio Mello afirma que, considerando o artigo 60 da Constituição, que impede a reapresentação de uma emenda constitucional na mesma sessão legislativa, a segunda votação sobre as doações de empresas às campanhas sequer deveria ter acontecido e seu resultado não tem o menor valor legal; texto foi aprovado em manobra do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB); “É uma visão que dá uma perspectiva real de sucesso a uma solicitação de 64 deputados já apresentada ao STF, questionando a PEC do financiamento de campanhas, derrotada por uma diferença de 76 votos na primeira votação”, afirma o jornalista Paulo Moreira Leite, diretor do 247 em Brasília; Mello rejeita ainda o impeachment de Dilma Rousseff; disse que não vê fatos capazes de autorizar uma investigação da presidente; ele também fez críticas ao juiz Sérgio Moro, fazendo ressalvas às delações premiadas da Lava Jato.

No final da entrevista do ministro Marco Aurélio Mello ao Espaço Público, programa da TV Brasil exibido nesta terça-feira, tive a certeza de haver presenciado um depoimento histórico, em companhia dos também entrevistadores Florestan Fernandes Junior e Felipe Recondo.

Com a experiência de quem irá completar 25 anos de Supremo Tribunal Federal, a entrevista de Marco Aurélio foi uma aula de 58 minutos, construída a partir de argumentos lógicos e principios claros, na qual o ministro não perdeu a oportunidade de confirmar uma de suas afirmações favoritas, aquela que diz que “a coragem é a maior das virtudes.” Pela importância do entrevistado, pela relevância dos assuntos que abordou, seu depoimento tem a força de um fato político.

Sem perder-se em raciocínios rebuscados e terminologia incompreensível, que costumam atazanar aparições públicas de tantas autoridades do judiciário, Marco Aurélio falou com firmeza e segurança a respeito de temas atuais, de alta importância política. Perguntando sobre um possível impeachment da presidente Dilma Rousseff, o ministro disse que não via fatos capazes de autorizar uma investigação da presidente. Sem deixar de manifestar a vontade de que possíveis irregularidades sejam investigadas e esclarecidas, Marco Aurélio deixou claro que duvidava das vantagens, para o país, enfrentar um segundo impeachment desde o retorno das eleições diretas, em 1989.

Uma semana depois que a Câmara aprovou a PEC que autoriza as contribuições de empresas privadas para partidos políticos, em segunda votação em 48 horas, o ministro não teve o menor receio de encarar o assunto, talvez o mais relevante daquela expressão (“reforma política”) que enganosamente dominou as conversas de Brasília nas últimas semanas.

Considerando que o artigo 60 da Constituição impede a reapresentação de uma emenda constitucional na mesma seção legislativa, o ministro lembrou um fato ululante, que sequer deveria ser discutido por pessoas sérias: a regra escrita na Constituição deve prevalecer acima de outras deliberações. Em outras palavras, a segunda votação sequer deveria ter acontecido e seu resultado não tem o menor valor legal. (por Paulo Moreira Leite)

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