“Mesmo sua formação acadêmica é estranha: mestrado e doutorado obtidos em três anos. Isso precisaria ser investigado, pois a formação mínima regulada pela CAPES-MEC (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Ministério da Educação) é de 24 meses para Mestrado e 48 meses para o Doutorado.Significa que “algo” ocorreu nessa formação apressada... Que “algo” é esse, é necessário apurar com rigor jurídico.”
“Superficiais e medíocres:
professor e pesquisador conta por que reprovaria a dupla Moro e Dallagnol
Docente e pesquisador da Universidade Estadual de
Maringá investigou a vida acadêmica de Moro e Dallagnol e encontrou inúmeras
inconsistências. “Os dois ainda vestem fraldas na ciência do Direito. São
guiados por preconceitos e pela cegueira da política sobre o Jurídico”.
Leia Por Marcos César Danhoni Neves* Sou professor titular de Física numa
universidade pública […]
Por
Marcos César Danhoni Neves*
Sou
professor titular de Física numa universidade pública (Universidade Estadual de
Maringá-UEM) desde 2001 e docente e pesquisador há quase 30 anos. Sou
especialista em história e epistemologia da ciência, educação científica, além
de processos de ensino-aprendizagem e análise de discursos.
Orientei mais de 250 alunos de
graduação, especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado, além de
professores in-service. Conto tudo
isso, como preâmbulo, não para me gabar, mas para salientar que li milhares de
páginas de alunos brilhantes, medianos e regulares em suas argumentações de
pesquisa.
Dito isso, passo a analisar duas
pessoas que compõem o imaginário mítico-heróico de nossa contemporaneidade
nacional: Sérgio Moro e Deltan Dallagnol.
Em relação ao primeiro, Moro,
trabalhei ativamente para impedir, junto com um coletivo de outros colegas,
para que não recebesse o título de Doutor honoris
causa pela Universidade Estadual de Maringá.
Moro tem um currículo péssimo: uma
página no sistema Lattes (do CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico ligado ao extinto MCT – Ministério da Ciência e Tecnologia). Lista
somente 4 livros e 5 artigos publicados.
Mesmo sua formação acadêmica é
estranha: mestrado e doutorado obtidos em três anos. Isso precisaria ser investigado,
pois a formação mínima regulada pela CAPES-MEC (Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior – Ministério da Educação) é de 24 meses para
Mestrado e 48 meses para o Doutorado.
Significa que “algo” ocorreu nessa
formação apressada.. Que “algo” é esse, é necessário apurar com rigor jurídico.
Além de analisar a vida acadêmica de
Moro para impedir que ele recebesse um título que não merecia, analisei também
um trabalho seminal que ele traduziu: “O uso de um criminoso como testemunha: um problema especial”, de Stephen S. Trott.
Mostrei que Moro não entendeu nada do
que traduziu sobre delação premiada e não seguiu nada das cautelas apresentadas
pelos casos daquele artigo.
Se seguirmos o texto de mais de 200
páginas da condenação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e guiando-me
pela minha experiência em pesquisa qualitativa, análise de discurso e
fenomenologia, notamos claramente que parte significativa do texto consiste em
Moro tentar apagar suas digitais, sem sucesso, ao desdizer que agiu com
imparcialidade.
Nestas páginas robustas lemos uma
declaração clara de culpa: Moro considera a parte da defesa de Lula em menos de
1% do texto total! E dos mais de 900 parágrafos, somente nos cinco finais
alinhava sua denúncia e sentença sem provas baseada num misto frankensteiniano
de “explanacionismo” (uma “doutrina” jurídica personalíssima criada por Deltan
Dallagnol) e “teoria do domínio do fato”, ou seja, sentença exarada sobre
ilações, somente.
Aqui uso a minha experiência como
professor e pesquisador: quando um estudante escreve um texto (TCC, monografia,
dissertação, tese, capítulo de livro, livro, ensaio, artigo), considero o
trabalho muito bom quando a conclusão é robusta e costura de forma clara e
argumentativa as premissas, a metodologia e as limitações do modelo adotado de
investigação.
Dissertações e teses que finalizam
com duas ou três páginas demonstram uma análise rápida, superficial e
incompetente. Estas reprovo imediatamente. Não quero investigadores apressados,
superficiais!
Se Moro fosse meu aluno, eu o teria
reprovado com esta sentença ridícula e persecutória. Mal disfarçou sua pressa
em liquidar sua vítima.
Em relação a outro personagem, o
também vendedor de palestras Deltan Dallagnol, há muito o que se dizer.
Angariou um título de doutor honoris
causa numa faculdade privada cujo dono está sendo processado por falcatruas
que o MP deveria investigar.
O promotor Dallagnol não seguiu uma
única oitiva das testemunhas de defesa e acusação de Lula, além daquela do
próprio ex-presidente.
Eu trabalho em pós-graduações stricto sensu de duas
universidades públicas: uma em Maringá e outra em Ponta Grossa. Graças a isso
fui contactado por meio de um coletivo para averiguar a dúvida sobre a compra
por parte de Dallagnol de apartamentos do Programa Minha Casa Minha Vida em
condomínio próximo à UEPG (Universidade Estadual de Ponta Grossa).
Visitei os imóveis guiado por uma
corretora e me dirigi ao Cartório de Registro de Imóveis da cidade. Após
algumas semanas, a resposta: os dois apartamentos modestíssimos, destinados a
gente pobre, tinham sido adquiridos pelo Promotor e estavam à venda com um
lucro líquido em menos de um ano de aquisição de 135 mil reais.
Reuni o material e disponibilizei
para a imprensa livre (aqui a matéria do DCM). O promotor teve que
admitir que comprou os apartamentos para ganhar dinheiro na especulação
imobiliária, sem resquícios de culpa ou de valores morais em ter adquirido
imóveis destinados a famílias com renda de até R$ 6.500,00 (Deltan chegou a
ganhar mais de R$ 80.000,00 de salários – além do teto constitucional, de cerca
de R$ 35.000,00; e mais de R$ 220.000,00 em suas suspeitosas palestras).
Bom, analisando os discursos de
Dallagnol, notamos claramente a carga de preconceito que o fez construir uma
“doutrina” de nome exótico, o “explanacionismo”, para obter a condenação de um
acusado sem prova de crime.
Chega a usar de forma cosmética uma
teoria de probabilidade – o bayesianismo – que ele nem sequer conhece ao
defender a relativização do conceito de prova: vale seu auto-de-fé a qualquer
materialidade de prova, corrompendo os princípios basilares do Direito.
Como meu aluno, ou candidato a uma
banca de defesa, eu também o teria reprovado: apressado, superficial e sem
argumentação lógica.
Resumindo: Dallagnol e Moro ainda
vestem fraldas na ciência do Direito. São guiados por preconceitos e pela
cegueira da política sobre o Jurídico.
Quando tornei-me professor titular
aos 38 anos, eu o fiz baseado numa obra maturada em dezenas e dezenas de
artigos, livros, capítulos, orientações de estudantes e coordenações de
projetos de pesquisa.
Infelizmente, estes dois personagens
de nossa República contemporânea seriam reprovados em qualquer universidade
séria por apresentar teses tão esdrúxulas, pouco argumentativas e vazias de
provas. Mas a “Justiça” brasileira está arquitetada sobre o princípio da
incompetência, da vilania e do desprezo à Democracia.
Neste contexto, Moro e Dallagnol se
consagram como “heróis” de papel que ficariam muito bem sob a custódia de um
Mussolini ou de Roland Freisler, que era o presidente
do Volksgerichtshof, o Tribunal
Popular da Alemanha nazista. Estamos sob o domínio do medo e do
neo-integralismo brasileiro.
*Marcos César Danhoni Neves é professor titular da Universidade
Estadual de Maringá e autor do livro “Do Infinito, do Mínimo e da Inquisição em
Giordano Bruno”, entre outras obras.
Publicado originalmente em 20 de julho de 2017
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