É
inédito que em tempos democráticos – pós-64 – tenhamos um Congresso Nacional tão
conservador, para não dizer retrógrado, como este que está aí, e o pior, quem o
colocou? Ele não surgiu como um passe de mágica demonizada ou de magia negra,
ele foi colocado ai pelo voto.
Votar
como um cordeiro tocado por lideres, entre aspas, inclusive – ou, sobretudo – religiosos
e/ou evangélicos, não é o que poderíamos chamar de um comportamento típico e
esperado em uma democracia, onde os pressupostos utilizados no exercício do
voto vão um pouco além do ato mecânico de fazer o que alguém mandou ou
determinou, afinal, o voto pressupõe um mínimo de conhecimento, consciência e liberdade,
mas, não foi o que ocorreu nas últimas eleições e não é o que vemos nos ‘trabalhos’
deste congresso que está aí.
"Ao cabo de uma longa temporada
de governos ditos de esquerda qual fosse pecado irreparável, a inextinguível
direitona nativa terá de admitir que se precipitou na definição caso seja
sacramentado o enterro da CLT, cerimônia esta de óbvia qualidade reacionária.
Como sabemos, o debate parlamentar a respeito do assunto está em andamento e
ainda há espaço para um veto presidencial, invocado em primeiro lugar por Lula.
A
história das nossas leis trabalhistas tem seu lado paradoxal. De fato, é
bastante peculiar. Getúlio Vargas, ao criar a legislação social brasileira,
recorreu à Carta del Lavoro encomendada por Mussolini ao jurista Alfredo
Rocco, competente do ponto de vista técnico, além de disponível para qualquer
empreitada. Certo é que o código fascista representava, pasmem à vontade, um
avanço notável para o Brasil do fim dos anos 30 e começos dos 40. Exemplo,
apenas: naquele tempo, empresas de São Paulo usavam máquinas adequadas à altura
de meninos de 12 anos e ao braço negro juntavam o branco, do emigrante.
Getúlio,
figura imponente da história, capaz de um projeto pioneiro de Brasil, não
deixou de se tornar ditador por largo período e de cultivar o chamado
peleguismo, assim como Mussolini transformou os sindicatos italianos, de
grandes tradições, em corporações sujeitas aos seus desígnios.
Houve
figuras respeitáveis mesmo na quadra dominada pelo peleguismo, herdeiros do
anarquismo que deflagrou as greves paulistanas nas duas primeiras décadas do
século passado, até a deportação de 400 anarquistas por Altino Arantes. Sem
condições, os herdeiros, de mudar o rumo que convinha aos donos do poder.
Decisivo,
para pôr fim ao peleguismo, o papel de Lula quando presidente do Sindicato dos
Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema. Negociador hábil, certamente, disposto
à composição, mas também ao confronto, se fosse o caso, como se deu nas greves
de 1978, 79 e 80. O pico de maior tensão em abril daquele último ano, quando
Lula foi preso e enquadrado na chamada, ignóbil, Lei de Segurança Nacional.
Melhor, de segurança da casa-grande. Aquele período de três anos precipita no
País um sindicalismo contemporâneo e forma futuros eleitores do Partido dos
Trabalhadores. E representa a mais eficaz resistência à ditadura civil-militar.
É
fácil entender como e por que o projeto da terceirização do trabalho fira
profundamente o ex-presidente do Sindicato de São Bernardo e Diadema, e do
Brasil todo, diante de quem o deputado Eduardo Cunha se posta como o vilão na
encruzilhada deste momento espantoso e insano a caminho do caos. E tanto mais
se o enterro da CLT se der em uma situação de impotência de um governo tido de
esquerda até ontem, ou anteontem. Por muitos, entre os quais não figuro há bom
tempo.
Ser
de direita ou de esquerda seria opinável hoje em dia, na crença de que os
contornos das ideologias esmaeceram, ou se apagaram de vez. Na qualidade de
crente da igualdade, creio que o governo de Lula foi francamente de esquerda ao
implementar suas políticas de inclusão social. A caducar a CLT, fenece o
impulso que fez brotar o PT, a partir das arengas de Lula do palanque da Vila
Euclydes.
Recordo que até a Time se comoveu então e dedicou a Lula uma
página, em reconhecimento da liderança nascente.
Desolador
até os limites extremos é que daquele enredo exaltante, a gerar 22 anos após o
governo do próprio líder do movimento, surja hoje quem possa chancelar o fim da
CLT velha de guerra. Assim como é sinal sinistro desta fase da nossa história o
poder de um Eduardo Cunha (na esteira, Renan Calheiros) a decidir os destinos
de todos nós.
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